segunda-feira, 21 de março de 2016

O Cavalo que Defecava Dinheiro

O Cavalo que Defecava Dinheiro
Leandro Gomes de Barros

Uma coisa eu aprendi
que ninguém faz discordância
Riqueza só é um mal
aumentada a importância
Dinheiro não é ruim
O ruim é a ganância

Na cidade de Macaé
Antigamente existia
Um duque velho invejoso
Que nada o satisfazia
Desejava possuir
Todo objeto que via

Esse duque era compadre
De um pobre muito atrasado
Que morava em sua terra
Num rancho todo estragado
Sustentava seus filhinhos
Na vida de alugado.

Se vendo o compadre pobre
Naquela vida privada
Foi trabalhar nos engenhos
Longe da sua morada
Na volta trouxe um cavalo
Que não servia pra nada

Disse o pobre à mulher:
─ Como havemos de passar?
O cavalo é magro e velho
Não pode mais trabalhar
Vamos inventar um "quengo"
Pra ver se o querem comprar.

Foi na venda e de lá trouxe
Três moedas de cruzado
Sem dizer nada a ninguém
Para não ser censurado
No fiofó do cavalo
Foi o dinheiro guardado

Do fiofó do cavalo
Ele fez um mealheiro
Saiu dizendo: ─ Sou rico!
Inda mais que um fazendeiro,
Porque possuo o cavalo
Que só defeca dinheiro

Quando o duque velho soube
Que ele tinha esse cavalo
Disse pra velha duquesa:
─ Amanhã vou visitá-lo
Se o animal for assim
Faço o jeito de comprá-lo!

Saiu o duque vexado
Fazendo que não sabia,
Saiu percorrendo as terras
Como quem não conhecia
Foi visitar a choupana,
Onde o pobre residia.

Chegou salvando o compadre
Muito desinteressado:
─ Compadre, Como lhe vai?
Onde tanto tem andado?
Há dias que lhe vejo
Parece está melhorado...

─ É muito certo compadre
Ainda não melhorei
Porque andava por fora
Faz três dias que cheguei
Mas breve farei fortuna
Com um cavalo que comprei.

─ Se for assim, meu compadre
Você está muito bem!
É bom guardar o segredo,
Não conte nada a ninguém.
Me conte qual a vantagem
Que este seu cavalo tem?

Disse o pobre: ─ Ele está magro
Só o osso e o couro,
Porém tratando-se dele
Meu cavalo é um tesouro
Basta dizer que defeca
Níquel, prata, cobre e ouro!

Aí chamou o compadre
E saiu muito vexado,
Para o lugar onde tinha
O cavalo defecado
O duque ainda encontrou
Três moedas de cruzado.

Então exclamou o velho:
─ Só pude achar essas três!
Disse o pobre: ─ Ontem à tarde
Ele botou dezesseis!
Ele já tem defecado,
Dez mil réis mais de uma vez.

─ Enquanto ele está magro
Me serve de mealheiro.
Eu tenho tratado dele
Com bagaço do terreiro,
Porém depois dele gordo
Não tem quem vença o dinheiro...

Disse o velho: ─ meu compadre
Você não pode tratá-lo,
Se for trabalhar com ele
É com certeza matá-lo
O melhor que você faz
É vender-me este cavalo!

─ Meu compadre, este cavalo
Eu posso negociar,
Só se for por uma soma
Que dê para eu passar
Com toda minha família,
E não precise trabalhar.

O velho disse ao compadre:
─ Assim não é que se faz
Nossa amizade é antiga
Desde os tempo de seus pais
Dou-lhe seis contos de réis
Acha pouco, inda quer mais?

─ Compadre, o cavalo é seu!
Eu nada mais lhe direi,
Ele, por este dinheiro
Que agora me sujeitei
Para mim não foi vendido,
Faça de conta que te dei!

O velho pela ambição
Que era descomunal,
Deu-lhe seis contos de réis
Todo em moeda legal
Depois pegou no cabresto
E foi puxando o animal.

Quando ele chegou em casa
Foi gritando no terreiro:
─ Eu sou o homem mais rico
Que habita o mundo inteiro!
Porque possuo um cavalo
Que só defeca dinheiro!

Pegou o dito cavalo
Botou na estrebaria,
Milho, farelo e alface
Era o que ele comia
O velho duque ia lá,
Dez, doze vezes por dia...

Aí o velho zangou-se
Começou logo a falar:
─ Como é que meu compadre
Se atreve a me enganar?
Eu quero ver amanhã
O que ele vai me contar.

Porém o compadre pobre,
(Bicho do quengo lixado)
Fez depressa outro plano
Inda mais bem arranjado
Esperando o velho duque
Quando viesse zangado...

O pobre foi na farmácia
Comprou uma borrachinha
Depois mandou encher ela
Com sangue de uma galinha
E sempre olhando a estrada
Pré ver se o velho vinha.

Disse o pobre à mulher:
─ Faça o trabalho direito
Pegue esta borrachinha
Amarre em cima do peito
Para o velho não saber,
Como o trabalho foi feito!

Quando o velho aparecer
Na volta daquela estrada,
Você começa a falar
Eu grito: ─ Oh mulher danada!
Quando ele estiver bem perto,
Eu lhe dou uma facada.

Porém eu dou-lhe a facada
Em cima da borrachinha
E você fica lavada
Com o sangue da galinha
Eu grito: ─ Arre danada!
Nunca mais comes farinha!

Quando ele ver você morta
Parte para me prender,
Então eu digo para ele:
─ Eu dou jeito ela viver,
O remédio tenho aqui,
Faço para o senhor ver!

─ Eu vou buscar a rabeca
Começo logo a tocar
Você então se remexa
Como quem vai melhorar
Com pouco diz: ─ Estou boa
Já posso me levantar.

Quando findou-se a conversa
Na mesma ocasião
O velho ia chegando
Aí travou-se a questão
O pobre passou-lhe a faca,
Botou a mulher no chão.

O velho gritou a ele
Quando viu a mulher morta:
─ Esteja preso, bandido!
E tomou conta da porta
Disse o pobre: ─ Vou curá-la!
Pra que o senhor se importa?

─ O senhor é um bandido
Infame de cara dura
Todo mundo apreciava
Esta infeliz criatura
Depois dela assassinada,
O senhor diz que tem cura?

Compadre, não admito
O senhor dizer mais nada,
Não é crime se matar
Sendo a mulher malcriada
E mesmo com dez minutos,
Eu dou a mulher curada!

Correu foi ver a rabeca
Começou logo a tocar
De repente o velho viu
A mulher se endireitar
E depois disse: ─ Estou boa,
Já posso me levantar...

O velho ficou suspenso
De ver a mulher curada,
Porém como estava vendo
Ela muito ensangüentada
Correu ela, mas não viu,
Nem o sinal da facada.

O pobre entusiasmado
Disse-lhe: ─ Já conheceu
Quando esta rabeca estava
Na mão de quem me vendeu,
Tinha feito muitas curas
De gente que já morreu!

No lugar onde eu estiver
Não deixo ninguém morrer,
Como eu adquiri ela
Muita gente quer saber
Mas ela me está tão cara
Que não me convém dizer.

O velho que tinha vindo
Somente propor questão,
Por que o cavalo velho
Nunca botou um tostão
Quando viu a tal rabeca
Quase morre de ambição.

─ Compadre, você desculpe
De eu ter tratado assim
Porque agora estou certo
Eu mesmo fui o ruim
Porém a sua rabeca
Só serve bem para mim.

─ Mas como eu sou um homem
De muito grande poder
O senhor é um homem pobre
Ninguém quer o conhecer
Perca o amor da rabeca...
Responda se quer vender?

─ Porque a minha mulher
Também é muito estouvada
Se eu comprar esta rabeca
Dela não suporto nada
Se quiser teimar comigo,
Eu dou-lhe uma facada.

─ Ela se vê quase morta
Já conhece o castigo,
Mas eu com esta rabeca
Salvo ela do perigo
Ela daí por diante,
Não quer mais teimar comigo!

Disse-lhe o compadre pobre:
─ O senhor faz muito bem,
Quer me comprar a rabeca
Não venderei a ninguém
Custa seis contos de réis,
Por menos nem um vintém.

O velho muito contente
Tornou então repetir:
─ A rabeca já é minha
Eu preciso a possuir
Ela para mim foi dada,
Você não soube pedir.

Pagou a rabeca e disse:
─ Vou já mostrar a mulher!
A velha zangou-se e disse:
─ Vá mostrar a quem quiser!
Eu não quero ser culpada
Do prejuízo que houver.

─ O senhor é mesmo um velho
Avarento e interesseiro,
Que já fez do seu cavalo
Que defecava dinheiro?
─ Meu velho, dê-se a respeito,
Não seja tão embusteiro.

O velho que confiava
Na rabeca que comprou
Disse a ela: ─ Cale a boca!
O mundo agora virou
Dou-lhe quatro punhaladas,
Já você sabe quem sou.

Ele findou as palavras
A velha ficou teimando,
Disse ele: ─ Velha dos diabos
Você ainda está falando?
Deu-lhe quatro punhaladas
Ela caiu arquejando...

O velho muito ligeiro
Foi buscar a rabequinha,
Ele tocava e dizia:
─ Acorde, minha velhinha!
Porém a pobre da velha,
Nunca mais comeu farinha.

O duque estava pensando
Que sua mulher tornava
Ela acabou de morrer
Porém ele duvidava
Depois então conheceu
Que a rabeca não prestava.

Quando ele ficou certo
Que a velha tinha morrido
Botô os joelhos no chão
E deu tão grande gemido
Que o povo daquela casa
Ficou todo comovido.

Ele dizia chorando:
─ Esse crime hei de vingá-lo
Seis contos desta rabeca
Com outros seis do cavalo
Eu lá não mando ninguém,
Porque pretendo matá-lo.

Mandou chamar dois capangas:
─ Me façam um surrão bem feito
Façam isto com cuidado
Quero ele um pouco estreito
Com uma argola bem forte,
Pra levar este sujeito!

Quando acabar de fazer
Mande este bandido entrar,
Para dentro do surrão
E acabem de costurar
O levem para o rochedo,
Para sacudi-lo no mar.

Os homens eram dispostos
Findaram no mesmo dia,
O pobre entrou no surrão
Pois era o jeito que havia
Botaram o surrão nas costas
E saíram numa folia.

Adiante disse um capanga:
─ Está muito alto o rojão,
Eu estou muito cansado,
Botemos isto no chão!
Vamos tomar uma pinga,
Deixe ficar o surrão.

─ Está muito bem, companheiro
Vamos tomar a bicada!
(Assim falou o capanga
Dizendo pro camarada)
Seguiram ambos pra venda
Ficando além da estrada...

Quando os capangas seguiram
Ele cá ficou dizendo:
─ Não caso porque não quero,
Me acho aqui padecendo...
A moça é milionária
O resto eu bem compreendo!

Foi passando um boiadeiro
Quando ele dizia assim,
O boiadeiro pediu-lhe:
─ Arranje isto pra mim
Não importa que a moça
Seja boa ou ruim!

O boiadeiro lhe disse:
─ Eu dou-lhe de mão beijada,
Todos os meus possuídos
Vão aqui nessa boiada...
Fica o senhor como dono,
Pode seguir a jornada!

Ele condenado à morte
Não fez questão, aceitou,
Descoseu o tal surrão
O boiadeiro entrou
O pobre morto de medo
Num minuto costurou.

O pobre quando se viu
Livre daquela enrascada,
Montou-se num bom cavalo
E tomou conta da boiada,
Saiu por ali dizendo:
─ A mim não falta mais nada.

Os capangas nada viram
Porque fizeram ligeiro,
Pegaram o dito surrão
Com o pobre do boiadeiro
Voaram de serra abaixo
Não ficou um osso inteiro.

Fazia dois ou três meses
Que o pobre negociava
A boiada que lhe deram
Cada vez mais aumentava
Foi ele um dia passar,
Onde o compadre morava...

Quando o compadre viu ele
De susto empalideceu;
─ Compadre, por onde andava
Que agora me apareceu?!
Segundo o que me parece,
Está mais rico do que eu...

─ Aqueles seus dois capangas
Voaram-me num lugar
Eu caí de serra abaixo
Até na beira do mar
Aí vi tanto dinheiro,
Quanto pudesse apanhar!..

─ Quando me faltar dinheiro
Eu prontamente vou ver.
O que eu trouxe não é pouco,
Vai dando pra eu viver
Junto com a minha família,
Passar bem até morrer.

─ Compadre, a sua riqueza
Diga que fui eu quem dei!
Pra você recompensar-me
Tudo quanto lhe arranjei,
É preciso que me bote
No lugar que lhe botei!..

Disse-lhe o pobre: ─ Pois não,
Estou pronto pra lhe mostrar!
Eu junto com os capangas
Nós mesmo vamos levar
E o surrão de serra abaixo
Sou eu quem quero empurrar!

O velho no mesmo dia
Mandou fazer um surrão.
Depressa meteu-se nele,
Cego pela ambição
E disse: ─ Compadre eu estou
À tua disposição.

O pobre foi procurar
Dois cabras de confiança
Se fingindo satisfeito
Fazendo a coisa bem mansa
Só assim ele podia,
Tomar a sua vingança.

Saíram com este velho
Na carreira, sem parar
Subiram de serra acima
Até o último lugar
Daí voaram o surrão
Deixaram o velho embolar...

O velho ia pensando
De encontrar muito dinheiro,
Porém sucedeu com ele
Do jeito do boiadeiro,
Que quando chegou embaixo
Não tinha um só osso inteiro.

Este livrinho nos mostra
Que a ambição nada convém
Todo homem ambicioso
Nunca pode viver bem,
Arriscando o que possui
Em cima do que já tem.

Cada um faça por si,
Eu também farei por mim!
É este um dos motivos
Que o mundo está ruim,
Porque estamos cercados
Dos homens que pensam assim.

FIM

quarta-feira, 9 de março de 2016

DO MISTÉRIO AO PARAÍSO

DO MISTÉRIO AO PARAÍSO
Poeta Merlânio Maia

A mulher é um mistério
Que homem nenhum desvenda
Nenhum filósofo sério
Assumiu essa encomenda
Sua atração tão potente
Gamou, não há ser vivente,
Dali ninguém sai curado
O homem entra iludido
Mandão, forte e destemido,
Sai manso e domesticado

Homem que tinha de tudo
Dinheiro, poder e fama,
A mulher lhe deixa mudo
Com os seus dotes de dama
Eita, bicho poderoso
Ô feitiço mais gostoso
Que faz do homem o que quer
Nada no mundo é mais forte
Nem mesmo a foice da morte
Tem a força da mulher

É um mistério, pois ela
É frágil, doce e melosa,
Cheirosa, atraente e bela,
Cativante como a rosa
Já o homem é todo duro
Desajeitado e inseguro
Bruto ao que der e vier
Mas essa ferocidade
Some na sagacidade
E na astúcia da mulher

Ah! Que coisa mais formosa
Que nos deixa sem juízo
E o seu perfume de rosa
Tem cheiro de paraíso
Não há quem fuja da ceia
Do cantar dessa sereia
Que encantará qualquer
Um que escute esse canto
Tem diabo que vira santo
Pela força da mulher

Há um encanto tão doce,
Tão forte e tão poderoso
Que quando o mundo formou-se
Adão se achava pomposo
Mandando na criação
Mais sabido que o leão
Forte ao que der e vier
Mas esse mundo acabou-se
Quando o coitado encontrou-se
Com a poderosa mulher!

Mas como viver no mundo
Sem carinho, sem afeto,
Sem seu hálito fecundo,
Sem o seu amor completo?
Como viver sem desejo,
Sem a delícia do beijo,
Sem um “pecadim” sequer?
Nada há melhor no juízo
Da mistério ao Paraíso
Que os braços duma mulher!